O isolamento é traiçoeiro

A pessoa afasta-se um dia, depois outro, e quando percebe já está a morar dentro da própria cabeça, sem janela nenhuma para deixar entrar um pouco de luz.
A mente, quando fica sozinha demais, cria histórias. E não são histórias bonitas. Ela pega qualquer tristeza e transforma em certeza absoluta. Aquele pensamento mau que, na correria do dia a dia, passaria despercebido, no isolamento torna-se um monstro com megafone. E o mais cruel: a pessoa começa a acreditar que não faz falta para ninguém, que ninguém se importa, que o mundo seguiria igual sem ela. Isso é mentira pura, mas quando não tem ninguém por perto para contradizer, essa mentira parece verdade.
O isolamento também rouba referência. Nós precisamos ver pessoas, ouvir voz, sentir movimento para lembrar que existe vida além da dor. Quando a pessoa se tranca, perde o contraste. Tudo fica cinza, uniforme, sem sentido. Fica mais fácil afundar, porque não tem nada ao redor que puxe para cima.
E tem outro detalhe que ninguém fala, mas muitos sentem: quando a pessoa desaparece, os outros não correm atrás com a mesma intensidade que ela esperava. Não é por maldade. É porque cada um está a viver a sua própria luta. Só que isso faz o isolado acreditar que ninguém o vê. E aí a espiral começa.